terça-feira, 21 de outubro de 2008


Retrospectiva DIR EN GREY: parte 4 ~ VULGAR


Mais de um ano se passou desde o último álbum, "KISOU". Mas, no meio do caminho, ainda em 2002, foi lançado um mini álbum chamado "six Ugly". Nele, DIR EN GREY demonstrou forte influência do nu metal estadunidense, adaptando-o com doses concentradas de loucura herdada do visual kei, o que resultou em alguns momentos imprevisíveis dentro do contexto de simplicidade do disco. Pois é, mesmo assim, o DIR parecia outra banda. Kaoru chegou a comentar em uma entrevista para a FOOL'S MATE (edição 271, maio de 2004) que pensou até em lançar o mini com outro nome de banda, como num projeto paralelo. Mas o grupo acabou por tomar essa direção. Será? Sim, não, mais ou menos? Foi o que pôde ser conferido quando "VULGAR" saiu em setembro de 2003.

VULGAR
2003
cor
ação
aprox. 57 min.

Quando assisti a um documentário da TV Asahi sobre o DIR EN GREY em meados do primeiro semestre de 2003, fiquei empolgado. Cenas de estúdio com rápidas prévias do próximo álbum, que eu tanto aguardara! É de atiçar qualquer fã. Uma coisa eu já tinha sacado pelo programa: ia ser um rockão agitado, pé na porta e soco na cara! E foi!

E mais uma vez teve gente que torceu o nariz. Já havia se tornado um fenômeno natural diante de qualquer lançamento da banda: fãs desgostando e dando menos atenção ao grupo, parando de comprar, etc (repito, fenômeno indicado pelas apurações da Oricon). Desta vez, depois do último mini álbum e dos últimos singles, a reclamação era de que o DIR havia, afinal, se ocidentalizado além da conta. O som havia virado um nu metal, os integrantes haviam abandonado o visual kei... Bom, eu diria 'mais ou menos' para ambas as questões.

Na mesma entrevista para a FOOL'S supracitada, Kaoru revelou que o conceito de "VULGAR" era justamente pegar esse som ocidental pesado e colocar uma melodia japonesa nele. Será que eles conseguiram? Vamos conferir...

O álbum abre com "audience KILLER LOOP", um exemplo muito bom de sua proposta. Começando com um grito e um riff pesado, a faixa tem um tempo médio e intercala momentos agressivos, porém melodiosos, com momentos calmos, tudo num clima obscuro, misterioso, dramático.

O ouvinte então depara-se com duas músicas pesadas e agitadas, sempre com estruturas e riffs simples. "THE IIID EMPIRE" é sim bem nu metal, provavelmente a música mais simples que o DIR ja fez na carreira. O vocal é basicamente gutural. Destaque para o back vocal bem distorcido. Já "INCREASE BLUE" é mais fácil de talvez ser associada a "KISOU", dada a natureza menos comum de sua melodia e os sentimentos insanos trabalhados nela (destaque aqui para o 'solo de voz distorcida' no meio da faixa).

"SHOKUBENI" me lembra Korn. O ritmo, o tempo, os riffs, os efeitos de guitarra, o baixo de cinco cordas... ela no geral. Exceto pela ponte no meio, só com voz, sintetizador e alguns efeitos pra temperar. Uma obscuridade que deu um clima diferente interessante no meio da canção.

"SAJOU NO UTA" surpreende quem pensou que o disco ficaria só em volta destes padrões. É uma música que não tem nada a ver com nu metal. Agitada e leve, as guitarras pouco distorcidas entoam uma harmonia extremamente simples, enquanto o baixo dança na escala. A maior parte da canção usa apenas dois acordes: Am e Am5# (lá menor e lá menor com quinta aumentada -- ou seja, apenas uma nota de diferença entre as três de cada acorde). E Kyo vocaliza uma melodia emotiva com certo drama. A faixa rápida e simples muda um pouco de figura numa ponte no meio do caminho. Surgem novos acordes, a melodia fica mais dramática e um solo bem simples, mas de timbre sugiziano (o que é bem-vindo!), é executado belamente por Kaoru.

A próxima música foi umas das que mais marcou a época entre os fãs. "RED... [em]" retoma o ritmo e a pegada nu metal, mas sua melodia a leva para outro clima. Talvez este tenha justamente sido o motivo dela chamar mais atenção. E o solo de guitarra está entre os de destaque de Die.

"ASUNAKI KOUFUKU, KOENAKI ASU" (consegui lembrar o nome de cabeça!) explora um dos clichês do visual kei: a música agitada estilinho jazz... e na proposta nu metaleira do disco. Na época, foi interessante ouvir o DIR mexendo com isso. Hoje, eu acho que o modelo está bem desgastado. Exemplos de grupos visuais famosos que ajudaram a chegarmos nessa situação são MUCC, SID e, lógico, o maior exemplo de todos, Merry.

"MARMALADE CHAINSAW", da turma de músicas de nomes esquisitos do DIR, assemelha-se um pouco a "RED... [em]" no que diz respeito a ser mas não ser... Seu arranjo lembra o nu metal, mas a melodia faz o clima geral apontar para outra direção. Até chegar no refrão, que é realmente outra história, distanciado-se do estilo ocidentalizado. Mais uma faixa de destaque. Ah! Esqueci de um detalhe nas outras partes do especial, mas esta é uma das músicas que usa o tradicional grito "psy" da cena visual (presumo, imortalizado principalmente pelo próprio DIR). As outras que também o usam são "PINK KILLER" (do "KISOU") e "ZAN" (do "GAUZE").

O lento single "KASUMI" não pede muita explicação. É algo bem dentro da descrição geral do estilo de "VULGAR".

Já "Я TO THE CORE" é uma pegadinha do Mallandro, haaaaaah! A introdução instrumental à la thrash metal esconde um som puramente punk de menos de dois minutos. E sim, o "R" é ao contrário.

"DRAIN AWAY", outro single, é talvez a faixa que mais remeta a alguma coisa antiga da banda. Metade do refrão possui um arranjo mais visual do que o resto da faixa, mais nu metaleiro, alternando entre partes pesadas e versos calmos.

"NEW AGE CULTURE" é curiosa. É pesada como outras músicas do disco, mas o próprio estilo de riff não me soa tanto como nu metal. Os vocais apresentam grunhidos que lembram as lições que Kyo aprendeu com Kiyoharu. Novamente temos um back vocal bem distorcido que chama atenção.

A faixa seguinte é talvez o maior clássico do álbum (será que mais por uma versão polêmica das três do clipe -- fora o PV com imagens ao vivo -- do que pela música em si?). "OBSCURE" novamente lembra Korn pelos seus riffs, efeitos e ritmo, mas desta vez com mais originalidade, mais marcante. Uma ponte que quase lembra thrash/death metal leva a um refrão que vai diretamente ao encontro da idéia do álbum de 'melodizar' esses tipos de som. É realmente uma canção de destaque por si só e por sintetizar bem o conceito de "VULGAR".

"CHILD PREY" pode parecer diferente por ser mais animada do que as outras e em alguns momentos pode lembrar alguns de Slipknot. Mas na verdade temos aqui simplesmente... BALZAC, uma banda japonesa que copia e é amiga dos ocidentais do The Misfits e define seu estilo como "horror punk" ou "zombiecore" (dá pra ter uma idéia?). Ouça qualquer -- QUALQUER -- álbum do BALZAC e eu garanto que você facilmente vai achar alguma(s) música(s) com elementos muito parecidos com alguns de "CHILD PREY". Os coros de "woooooo" principalmente.

Por fim, "AMBER" encerra. É a 'balada' do disco, se é que todo precisa ter uma. Ela é faixa mais calma do álbum, bem melódica, usa pouca distorção e é temperada com alguns efeitos eletrônicos aqui e acolá. Chega a ser bonita. Um belo jeito para terminar "VULGAR".

Sim, DIR EN GREY abraçou o nu metal, mas não é só isso que temos aqui. Outros elementos são evidentemente explorados. E mesmo assim, eu diria que é o nu metal de maior qualidade já feito. Não é excessivamente barulhento, o peso está na medida certa. Tem músicas bem boladas, cativantes, com melodias boas, marcantes.

É certo que a qualidade técnica já não era mais a mesma, devido, até mesmo, ao próprio estilo adotado. Eu diria que, tecnicamente, o DIR estava parecendo a atual bolsa de valores: cheio de altos e baixos consideravelmente oscilantes. Os riffs, fraseados, harmonias e ritmos dos instrumentos de cordas ficaram mais simples. Porém, Shinya procurou explorar novos truques, usou de variações ritmicas maiores do que no álbum anterior e Kyo foi o destaque dos cinco no quesito técnico. Sim, isso mesmo. O baixinho enfesado alcançou seu auge vocal entre 2003 e 2004. As melodias tornaram-se mais difíceis de serem cantadas, os erros tornaram-se menos frequentes e os recursos vocais foram levemente ampliados. Ao canto, grunhidos e gritos pós-Kiyoharu e eventuais sons estranhos, Kyo demonstrou um belo domínio do gutural e do drive (que não é gutural nem grito, é algo mais técnico, como, por exemplo, o que HIZUMI, do D'espairsRay, faz com excelência no refrão de "Marry and blood"). E estas qualidades não apareceram somente em estúdio, sendo mantidas ao vivo.

Não manjo muito de letras, mas nessa época o DIR assumiu o tal conceito de 'dor e sofrimento'. Kyo até chegou a ser creditado como 'profeta' no encarte de "VULGAR". Eu diria que nada disso merece muita atenção.

A arte do disco é simples e eficaz, com muito preto e idéias interessantes para algumas fotos, principalmente a de Die enfiando a mão no peito esburacado de um cara idêntico a ele... (?!)

Uma das promoções do disco foi inédita para a banda. Rolou um concurso de sites sobre o "VULGAR". Até ficou disponível no site oficial do DIR um kit com imagens pra serem usadas. Lembro que nos primeiros lugares ficaram uns realmente bem feitos... Só não lembro do prêmio, mas teve um sim! =p

Os clipes foram meio a meio. O do primeiro single, "Child prey", que saiu ainda em 2002 junto com "six Ugly", é meu preferido da banda. É bem divertido e eu diria que faz uma metáfora de como, mesmo influenciados pelos estadunidenses (no vídeo, seriam os ratinhos que fazem com suas naves um buraco no formato do símolo do Mickey Mouse numa parede), o DIR EN GREY consegue superá-los e fazer algo melhor.



Não vejo graça nos vídeos de "DRAIN AWAY" e "KASUMI", mas "OBSCURE" não deu pano pra manga à toa. As primeiras versões divulgadas eram uma com censura -- onde muitas partes eram quase completamente tapadas por uma escuridão que revelava apenas uma pequena parte quadricular da cena no meio da tela -- e uma sem censura, mostrando a banda tocando em um lugar estranho com corpos pendurados, Kyo vomitando líquidos diversos, uma orgia demoníaca, palhaço, anão, cuspidor de fogo, tudo caminhando para o macabro. OK. Só queeee... mais tarde caiu na rede uma versão do clipe com outra edição. Mostrava também uma mulher que sofreu uma estranha cirurgia, detalhes mais sangrentos da orgia, Kyo com boca de monstro, Shinya com vários braços, Kaoru enfiando uma espada na própria cabeça, Die arrancando o próprio coração e Toshiya 'draculista' transformando-se em um bando de morcegos. Ah, e uma gueixa comendo uma cabeça de bebê colhida num pé de cabeça de bebês. É um vídeo bem apelativo e com vários efeitos especiais de qualidade altamente questionável (mas a cena do Toshiya virando morcegos é muito foda!). Porém, foi um PV divertido pra mim e pra algumas pessoas na época! A versão censurada saiu num DVD bônus do álbum (distribuído pela Sony Entertainment). As versões light e com cenas ao vivo passaram na televisão. E a versão sem censura e mais apelativa só saiu no DVD de clipes "AVERAGE PSYCHO" (distribuído pela FREE-WILL, gravadora dos caras -- creio que a Sony não aceitaria isso nem fodendo).


O visual do grupo estava bem OBSCURO, seguindo o padrão de todo o trabalho, só que mais sóbrio. Todavia, não se podia dizer que a banda havia abandonado o visual kei. É bem evidente que eles ainda tinham um cuidado com a aparência bem maior do que o cuidado que as bandas não visuais têm. Se até Gackt e Waive são visual kei, imagine o DIR nessa época. Por que não seria? Além disso, visual kei não tem necessariamente só a ver com o visual, mas também com todo um contexto.

Tudo foi muito bem até agora, eu diria. Mas o bicho começa a pegar mesmo ao vivo. Quem achou que o DIR EN GREY havia virado outra banda em 2002, ainda não havia visto nada. No DVD de 2004 "TOUR04 THE CODE OF VULGAR[ism]", vemos um DIR bem energético, emotivo, interagindo com o público, etc. Mas nos bônus do próprio DVD, vemos cenas documentadas ao longo da turnê que mostram outra coisa. Com excessão de Kyo e Shinya, os outros instrumentistas ficam muito parados, tocando olhando demais pra baixo, sem ânimo... ao menos em comparação com o que eles faziam. Parece que estão fazendo algo porque precisam ou são obrigados, não porque realmente gostam. Coincidência ou não, depois de "VULGAR" foram extinguidas fotos e vídeos que mostravam a banda sorrindo e se divertindo nos bastidores de shows e outras circunstâncias (clássico de 1999, por exemplo). Outro detalhe chamativo é que nessa época as músicas antigas passaram a ser muito esquecidas pela própria banda.

Kyo teve melhoras e pioras. Suas melhorias vocais previamente aqui descritas se mantiveram ao vivo. Infelizmente, ele deu novos passos no caminho da auto-mutilação. Seu novo truque era esmurrar a própria cara até cuspir sangue. Na verdade, estou pouco me lixando pra saúde mental ou mesmo física do cara, contanto que isso não interfira em seu trabalho musical. Todavia, isso acabou por configurar em um problema pouco tempo depois dessa época de 2003/2004.

Em resumo, DIR EN GREY fez um som que, sob certa ótica, seria inferior ao que eles já haviam feito. Mas certamente eles fizeram em "VULGAR" algo bem feito dentro de sua proposta e também, muito importante, algo diferente. Os fãs que já os acompanhavam há algum tempo já queriam isso mesmo: mudança. Infelizmente, os shows, aparentemente, já não tinham a mesma força.

Mas e aí? O DIR havia definitivamente se ocidentalizado? Este era um processo em andamento. E, embora com certeza não fosse ainda o caso, o quinteto rumava para o caminho da perda total da identidade. O mais triste foi que, talvez não ainda nessa época (eu sei que ainda não explicitamente, ao menos), mas sem dúvidas pouco tempo depois, o DIR desenvolveu uma mentalidade/atitude de aversão, repúdio e negação à música japonesa. Detalhes serão discutidos na sexta e última parte deste especial, mas, por enquanto, observem o que está escrito atualmente no site oficial da banda sobre "VULGAR", na parte da biografia do grupo:

"Setembro: lança o quarto álbum, 'VULGAR'. Sua originalidade e estilo ficam estabelecidos. (...) Comparado ao rock da América (eles querem dizer 'Estados Unidos da América', dãr) DIR EN GREY tinha agora a mesma qualidade e nada menos."
O texto serve de adubo, pois é uma grande merda. Aliás, é parcialmente aproveitável, pois possui verdades e inverdades.

Verdades: O estilo começou a se estabelecer em algo que se estenderia pelo menos por mais dois álbuns e sim, trata-se, de fato, do quarto álbum do grupo.

Inverdades: Nenhuma pessoa sã declararia "VULGAR" ou qualquer coisa que veio depois, por ora, o trabalho mais original do DIR EN GREY; O nível técnico das músicas diminui, assemelhando-se ao de músicas do nu metal -- assim, sob certa ótica, a qualidade do DIR ficou igual à das bandas da 'América' e nada menos, nem muito mais.

No final das contas, a época do "VULGAR" foi parcialmente legal. Mais uma vez num jeito bolsista de ser, o buraco era bem mais embaixo.

VULGAR

01. auciende KILLER LOOP
02. THE IIID EMPIRE
03. INCREASE BLUE
04. SHOKUBENI
05. SAJOU NO UTA
06. RED... [em]
07. ASUNAKI KOUFUKU, KOENAKI ASU
08. MAMALADE CHAINSAW
09. KASUMI
10. Я TO THE CORE
11. DRAIN AWAY
12. NEW AGE CULTURE
13. OBSCURE
14. CHILD PREY
15. AMBER

Nota: 4,0/5,0 ~ Mas não abusa não, hein!

[Ouça]

~

Não perca a penúltima e emocionante parte do especial, a quinta, sobre "Withering to death."!

7 comentários:

Anônimo disse...

e a nota? xD

fnossa, fiquei impressionada com os detalhes! o.o

parabéns pela retrospectiva do DIR! ^^ e pelo blog também ! xD

iori disse...

Puta que la merda! Esqueci! Brigado XD

E brigado também pelo elogio! =D

Lara disse...

O Vulgar é meu álbum favorito deles, mas não é nem por méritos musicais ou sei lá, tem uma série de influências externas pesando. :p Foi a fase em que fui mais fã deles, mas concordo que depois houve uma decadência, tanto que minha admiração foi sumindo junto (tá que o fato de uma conhecida que era fangirl deles ficar falando dos caras o dia todo também ajudou, mas deixa quieto).
Tô doida pra ler a do Withering to death, que pra mim é o verdadeiro começo da bagaceira (embora também goste dele). :p

Daisuke .S. disse...

sempre achei Withering to death um dos melhores albuns do Deg (vendeu mais do que Vulgar, inclusive), é bem sólido e ao mesmo tempo inova no estilo deles.

Pra mim o odio ao Deg pós visual se deu àquela corrente na internet, a mesma que diz que Gazette é um lixo.Gostos pessoais a parte, isso é um saco, a maioria conheçe muito pouco sobra a(s) banda(s) para dizer que hoje é ruim e ontem não.

iori disse...

Daisuke, me referi a gente que, como eu, era fã da banda e passou a não gostar ou até mesmo a desgostar deles.

Paulo Henrique disse...

Realmente, ótima restrospectiva... Tem detalhes bem legais ae... Parabéns pelo trabalho =D

iori disse...

Muito obrigado! =)